domingo, 4 de abril de 2010

Tudo na vida se reduz a uma única frase: pra ganhar, tem que perder. O que a gente faz é dar o devido peso às coisas. Se elas valem a pena, por que não? O gris existe. Não só o preto e o branco.

É o silêncio que acaba por dilacerar a alma ávida por ruídos. E o corpo anseia pela vida que - junto contigo - se deixa esvair entre os dedos...

Eternidade

O sol que invade a sala das lembranças não aquece mais a alma. Já é hora de fechar as gavetas da esperança e o armário da mente conturbada. Deixo a cama pronta pra partida do sonho. Lacro o frasco do eterno pra não perder a essência dos bons momentos. E bebo do teu veneno antes que me entregues em bandeja de prata e vire um bibelô qualquer na estante empoeirada do teu passado.
Ah, desejo besta de te ter ao menos na memória e que me guardes na tua feito pedra preciosa...

Insuficiência

Nada se move. Nem uma folha sequer. E eu permaneço estagnada ainda que mantenha-me ocupada em todos os malditos minutos no dia. Nada se move. Não há vento algum pra varrer essa sujeirada que se acumulou no caminho. Chove - e muito! -, mas a água não é suficiente pra lavar a crosta grossa de decepções que começa a pesar o corpo...

Nem se me conhecesse em cores - ou em gris, vez em quando - Clarice Lispector me traduziria tão bem...

Sou composta por urgências: minhas alegrias são intensas; minhas tristezas, absolutas. Me entupo de ausências, me esvazio de excessos. Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos.
Clarice Lispector

sábado, 3 de abril de 2010

Normose

Curitiba, 17-18°C, Sexta-feira Santa à noite: sopa Leão Veloso, suco de tangerina e entre uma besteira e outra, algo filosófico surgia...
'Normose'
(a doença de ser normal)

Todo mundo quer se encaixar num padrão. Só que o padrão propagado não
é exatamente fácil de alcançar. O sujeito "normal" é magro, alegre,
belo, sociável, e bem-sucedido. Bebe socialmente, está de bem com a
vida, não pode parecer de forma alguma que está passando por algum
problema. Quem não se "normaliza", quem não se encaixa nesses padrões,
acaba adoecendo. A angústia de não ser o que os outros esperam de nós
gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações
de não enquadramento.

A pergunta a ser feita é: quem espera o quê de nós? Quem são esses
ditadores de comportamento que "exercem" tanto poder sobre nossas
vidas? Nenhum João, Zé ou Ana bate à sua porta exigindo que você seja
assim ou assado. Quem nos exige é uma coletividade abstrata que ganha
"presença" através de modelos de comportamento amplamente divulgados.

A normose não é brincadeira. Ela estimula a inveja, a auto-depreciação
e a ânsia de querer ser o que não se precisa ser. Você precisa de
quantos pares de sapato? Comparecer em quantas festas por mês? Pesar
quantos quilos até o verão chegar?

Então, como aliviar os sintomas desta doença? Um pouco de auto-estima
basta. Pense nas pessoas que você mais admira: não são as que seguem
todas as regras bovinamente, e sim, aquelas que desenvolveram
personalidade própria e arcaram com os riscos de viver uma vida a seu
modo. Criaram o seu "normal" e jogaram fora a fórmula, não patentearam, não
passaram adiante. O normal de cada um tem que ser original. Não
adianta querer tomar para si as ilusões e desejos dos outros. É
fraude. E uma vida fraudulenta faz sofrer demais.

Eu simpatizo cada vez mais com aqueles que lutam para remover
obstáculos mentais e emocionais e tentam viver de forma mais íntegra,
simples e sincera. Para mim são os verdadeiros normais, porque não
conseguem colocar máscaras ou simular situações. Se parecem sofrer, é
porque estão sofrendo. E se estão sorrindo, é porque a alma lhes é
iluminada. A normose está doutrinando erradamente muitos homens e
mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e
felizes.

Michel Schimidt
Psicoterapeuta

Normal? Eu? Postando às 3:56 da madruga... Sei não.